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Norma que traz diretrizes para uso da internet no Brasil pode alterar modelos de negócios. Foco das discussões será o impacto econômico

Poucas legislações deixaram uma interrogação tão grande para a economia quanto o Marco Civil da Internet, que traz diretrizes para uso da ferramenta no Brasil. Menos de um mês após a lei entrar em vigor, está cada vez mais claro que o debate em torno da proposta de regulamentação, previsto para começar em agosto, não terá como foco direitos civis, mas o impacto para os segmentos econômicos envolvidos. Explica-se: no bolo de interessados estão setores que abrangem companhias concorrentes e com interesses às vezes opostos, como empresas de internet, telecomunicações, software, marketing digital e comércio eletrônico, para citar algumas.

“Temos setores muito regulados, como o de telecomunicações, e outros nem tanto, como os de internet, com cargas tributárias diferentes”, avalia Ana Luiza Valadares Ribeiro, da Associação Brasileira de Direito da Tecnologia da Informação e das Comunicações (ABDTIC), que estuda reflexos do uso da tecnologia. Para completar, o desempenho de pelo menos um setor, o de teles, tem efeito direto sobre a arrecadação de impostos. “Há um pleito de equilíbrio [por parte das empresas] e no Brasil temos mania de fazer com que isso seja explicado por lei”, diz.

Até agora, a lei trouxe poucas necessidades de adaptação – apenas a regulamentação jogará luz no cenário. As adequações estão centradas na necessidade de empresas usarem bancos de dados para armazenar históricos de navegação, avisar usuários sobre a coleta de dados e estabelecer canais para pedidos de remoção de conteúdo. Medidas essas que serão mais complicadas para pequenas empresas e startups. As teles sentiram reflexos maiores. Ao impedir tratamento diferente no acesso ao conteúdo, a lei deixou na berlinda a venda de pacotes de dados exclusivos para navegação em redes sociais, por exemplo. Representante do setor, o Sinditelebrasil não comenta o tema.

Segurança e hospedagem de dados podem se beneficiar

Sem a regulamentação do Marco Civil, as chances de negócio para certos setores de tecnologia ficam no terreno da expectativa, mas há dois nichos que pensam nisso faz alguns anos. Segundo o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), cerca de metade dos 20 aportes anuais (em média) da linha de financiamento de R$ 500 milhões para desenvolvimento de softwares trata de iniciativas de segurança e de hospedagem de dados.

O perfil se consolidou nos últimos sete anos, período em que negócios que usam internet amadureceram e o marco regulatório foi discutido. “A lei tem efeito direto no ramo de armazenamento de dados e de hospedagem em nuvem. Empresas de segurança da informação também crescem muito, por causa do marco e da computação em nuvem, já que estão relacionados”, diz Irecê Loureiro, chefe de tecnologia da área industrial do BNDES.

Cuidados

Especialista em soluções de segurança – inclusive contra vazamento de dados –, a Arcon espera aumento de negócios, ainda que não arrisque em que medida isso ocorrerá. Para o gerente Raphael Pereira, as maiores empresas buscaram adequação nos últimos anos, mas nova demanda deve ocorrer na esteira do primeiro “incidente” punitivo. “Empresas investem quando têm problemas, mesmo que não seja a melhor postura”, diz.

No site da Mandic, referência em hospedagem em nuvem, um banner compele empresários a refletir sobre o sigilo de dados nas suas empresas. Porém, o presidente da Mandic, Mauricio Cascão, é pragmático quanto a expectativas. Avalia que a lei tornou competitivos os serviços brasileiros de hospedagem em relação aos dos EUA, onde o Ato Patriota criou uma saia justa para clientes que buscam privacidade. Por ora, Cascão vê o marco como bom argumento de venda.

Dono da curitibana WSU, que usa softwares livres para oferecer monitoramento de dados, Rodrigo Carvalho está otimista. Ele acredita que a lei pode estimular empresas a tomarem mais cuidado com a forma com que os funcionários navegam na internet, já que terão obrigação jurídica de dispor de dados. “Podemos ganhar na escala”.

“Temos setores muito regulados, como o de telecomunicações, e outros nem tanto, como os de internet, com cargas tributárias diferentes”, avalia Ana Luiza Valadares Ribeiro, da Associação Brasileira de Direito da Tecnologia da Informação e das Comunicações (ABDTIC), que estuda reflexos do uso da tecnologia. Para completar, o desempenho de pelo menos um setor, o de teles, tem efeito direto sobre a arrecadação de impostos. “Há um pleito de equilíbrio [por parte das empresas] e no Brasil temos mania de fazer com que isso seja explicado por lei”, diz.

Até agora, a lei trouxe poucas necessidades de adaptação – apenas a regulamentação jogará luz no cenário. As adequações estão centradas na necessidade de empresas usarem bancos de dados para armazenar históricos de navegação, avisar usuários sobre a coleta de dados e estabelecer canais para pedidos de remoção de conteúdo. Medidas essas que serão mais complicadas para pequenas empresas e startups. As teles sentiram reflexos maiores. Ao impedir tratamento diferente no acesso ao conteúdo, a lei deixou na berlinda a venda de pacotes de dados exclusivos para navegação em redes sociais, por exemplo. Representante do setor, o Sinditelebrasil não comenta o tema.

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Ao tentar equilibrar a defesa por modelos de negócios, a regulamentação terá de abranger o marketing digital. A principal preocupação do setor é que a necessidade de autorização para uso de dados obrigue empresas a informar o usuário sobre a instalação de cookies – espécie de pasta com dados de navegação que o site cria no computador do internauta para “adivinhar” necessidades. A ferramenta é uma das mais utilizadas por empresas de internet e e-commerces, juntamente com a inteligência artificial. “Se o aviso para o uso de cookies se tornar obrigatório, todas as empresas estarão inconformes”, diz Pedro Guasti, da consultoria Ebit, especialista em comércio eletrônico.

Caso esses mecanismos dependam de anuência, a navegação pode dificultar o negócio, considerando as negativas de usuários, explica Guasti. A situação mantém gigantes do e-commerce e outra grande empresa de sobreaviso: o Google Brasil, responsável pela segunda maior fatia do mercado publicitário do país – R$ 3,5 bilhões em 2013, livres de tributos, segundo o Ministério das Comunicações.

 Será que Vai pegar?

 O Ministério da Justiça, que está à frente da regulamentação do Marco Civil, prevê longa discussão pública em torno do anteprojeto, cujo texto espera concluir neste ano. A fiscalização, diz a pasta, ficou a cargo de órgãos de defesa do consumidor, Ministério Público e até polícias. Especialistas se dividem sobre se a lei vai ou não pegar. “É cedo, mas a eficácia vai depender do aparato público para fiscalização e da agilidade das ações judiciais”, diz Ricardo Fachin, da consultoria FH. Já o advogado Renato Opice Blum, da Fecomércio-SP e da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) avalia que, por ora, o efeito do marco é mais “didático” do que punitivo.

Fonte: Gazeta do Povo